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sábado, 2 de março de 2013

Uma resenha animada



um filme não tão valente assim
Há alguns anos, com as inovações da Pixar a partir de Toy Story, animações conseguem abranger assuntos profundos e filosóficos com e para o olhar de uma criança. Como sou um apaixonado por animações, nunca digo não quando convidado (na maioria por mim mesmo) para assistir alguma e posso dizer ser fã de carteirinha da Pixar. Assisti Valente dias atrás e infelizmente percebi que eles não acertaram tanto na mão. Os personagens não eram tão carismáticos e o enredo parecia vir de roteiristas muito cansados que não faziam ideia de como sair da onde se meteram e, olha só, infantil demais para o nível das animações que concorriam com ele ao Oscar. Infelizmente, o Oscar de Melhor Animação foi para Valente, deixando dois concorrentes muito merecedores e ousados tristes: Detona Ralph e ParaNorman. Acredito que foi exatamente por isso que não ganharam o prêmio: a ousadia. Entre os dois, ParaNorman se destaca pela maturidade em temas bem peculiares e é sobre esse rapaz de cabelo de vassoura de bruxa que vou tentar rabiscar umas falhas palavras de emoção louca de um amante de animação.

     
         Entre a animação em geral, sou um eterno apaixonado pelo stop-motion. Não sei, não me perguntem coisas técnicas e seus relativos, aqui fala um cara que só entende do sentir que um filme lhe passa e posso dizer que o cuidado e o carinho de stop-motions sempre me ganhou. Talvez pela delicadeza e fluidez diferente dos demais, talvez pelos detalhes conseguidos de uma maneira tão árdua e artística, talvez por saber que tem trinta caras soando pra cacete pra fazer uma cena de dez segundos e que conseguem fazer um filme de uma hora e meia com maestria, talvez por sentir calor humano, um contato maior artista e arte, que modifica aos meus olhos estrábicos e obsessivos compulsivos. ParaNorman já começou me ganhando por isso. Não que eu soubesse que era stop-motion no inicio nem enquanto o filme passava, mas quando comecei a pesquisar para essa resenha mal desenhada e vi essa foto (então o certo seria que ParaNorman terminou me ganhando com esse fato, não começou, o que demonstra que o filme é além de sua animação).



    Norman é um garoto comum com uma capacidade que o difere dos demais e é daí que começa a dificuldade em sobreviver num lugar de iguais sendo tão destoante. Pela sua dicotomia, que, para o expectador inesperado quando é revelada surpreende (e isso é no começo do filme, mas não darei spoiler algum para te deixar com água na boca), ele é excluído e massacrado pelos que não o compreendem ou que apenas tem medo de seu jeito de ser.



 Norman e seu amor pelo macabro
     Veja, não existe o mau ou o bom, as pessoas são impulsionadas pelo medo, pelo preconceito e pela maneira como enxergam as coisas com os olhos turvos ou límpidos e é aí o primeiro ponto de suma importância desse filme e que demais filmes de animação vem fazendo (como exemplo, Detona Ralph): A quebra do maniqueísmo para as crianças. Botar desde cedo um tema tão trabalhado pesadamente em livros e filmes (Dançando no Escuro, do Lars é o exemplo mais pontiagudo que me veio à cabeça) numa linguagem irreverente e acessível é uma obra de arte a parte. Acredito que esse tipo de realidade que se expõe na mente de um ser desde jovem serve como salvador de vidas, quebrando conceitos sociais velhos e deturpados que estragam e limitam o ser humano. E isso o filme faz com maestria, quando as realidades invertem-se e tudo se resolve numa tentativa desesperada de diálogo entre seres cegos que utilizam a pancadaria acéfala para terminar com seus problemas. Ta aí, mais uma crítica da ParaNorman: à sociedade cega, surda e muda, marionetes do medo imposto pela mídia em geral, à sociedade violenta onde o mais puro apelo de socorro verdadeiro é perdido entre balburdias e agressões verbais cegas. E vemos então outra crítica: à falta de diálogo entre pais e filhos, essa distância de eras que não se compreendem, talvez por não falarem a mesma língua, talvez pela inveja que existe da maturidade pela juventude, talvez por não estarem na mesma onda vibratorial (e encaixe aqui todos os argumentos filosóficos e espirituais que conheças), abre-se um enorme abismo entre seres que moram tão perto, um enorme muro berliniano entre suas realidades, e passa-se à total incompreensão de ambas as partes que procuram o porquê de atos tão estranhos do outro em resposta aos seus.

     
E é isso que vemos na gama de relacionamentos dos filmes: os excluídos sociais, os excluídos familiares, os narcisistas perdidos dentro de si, os brutos incompreensíveis, os mansos delicados, os idiotas monstruosos, os especiais, todos juntos num só balaio de gato tentando se comunicar da maneira que conseguem, verdadeira torre de Babel, em suas linguagens dicotômicas que logo viram um grito enorme de incompreensão mútua. A descoberta do sexo e da violência também são marcados, ainda que de passagem, no filme, com pequenas piadas que devem deixar os pais de cabelo em pé nos cinemas junto dos filhos, por serem inesperadas de saírem da boca de criaturas tão bonitinhas. Bonitinhas e cheias de problemas, como todos nós e isso, ah, isso sim assusta; onde já se viu um filme de animação ser tão real em sua surrealidade?


Para mim, os roteiristas e animadores estão de parabéns pela ousadia que sempre precisou existir nessa esfera de filmes. A fábula e a trama é bem diferente, com subtemas de muita discussão, tais como: a exploração capitalista em cima de um fato histórico, vida e morte, realidades, o medo do ser humano explodindo por todos seus poros, a cegueira da violência, o “bullying” nas escolas e em todos outras dimensões existenciais da vítima, a amizade além das diferenças, a quebra do maniqueísmo, as escolhas e suas respostas futuras, a falta de diálogo e compreensão, a sexualidade, e talvez mais, para aqueles que enxergam além do meu horizonte encaixotado. E além de toda essa profundidade tão bem desenhada numa camada lúdica e fluida (tanto que nem percebemos quão pesado é tudo aquilo que passa correndo pelos nossos olhos) o filme é uma grande homenagem aos filmes clássicos de terror. Sim, ParaNorman nada mais é que, além de tudo isso, uma animação stop-motion de humor negro e terror infantil e posso dizer, sem nenhuma vergonha, que até eu fiquei temeroso certos momentos.


O que mais me surpreendeu foi o modo gracioso em que tocaram com a temática vida e morte, brincando com essa fina linha que separa os mortos e vivos e que foi tanto mexida ao longo dos anos. Não vi nenhum outro filme falar disso com tanta franqueza (fora Mary and Max). A cena final das descobertas e do alívio de uma alma presa na dureza da terra e por isso muito, muito brava, é de uma beleza tocante. Da música aos diálogos à arte visual, tudo paira numa fluidez espectral, afinal, tudo é muito belo, sabe?, aquela beleza rara e frágil de uma criança?, isso se encontra em momentos duros, o amor entre os espinhos tesos loucos para arrancar sua pele, a flor que nasce entre as ervas daninhas do desentendimento. O espectador apaixonado torce para um amor além dimensões, mas isso não é possível, nem numa animação, veja você. E ficamos na mão, mesmo felizes, porque o ser merece um pouco de amor no meio de tanta falácia, arrogância e solidão. Ao fim ele tem, tem sim, mas o quanto se desgastou pra isso é muito maior.


Hoje, posso marcar ParaNorman junto das minhas animações prediletas (Wall-e, Toy Story, Procurando Nemo, O Estranho Mundo de Jack [que é um clássico nesse quesito], Mary and Max [essa vale fazer uma resenha a parte também] e outros amigos que aqui me esqueço) e se não assistiu, por favor, desliga esse computador e vai alugar o mais rápido possível. E sim, chama os primos, os parentes, a avó, a mãe, os amigos, é um filme universal que fala todas as línguas em sua ousadia deliciosa. Deixo aqui a bela trilha sonora da parte final, que é muito tocante (especialmente a partir dos 2:10 do vídeo, se não tiver paciência, pule pra esse momento, dispa-se de si e sinta).

























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